Enquanto o planeta orbita ao redor do Sol, mantemo-nos a cultivar a ilusão de que este astro nasce a leste pelas manhãs e caminha rumo a oeste, onde oculta-se para além do horizonte. Este mito indelével, entretanto, é-nos precioso para compreender o nosso paradigma da contagem e marcação do tempo.

Esta percepção de um curso solar diurno permite-nos compreender mais facilmente o fato de que, enquanto nalgum ponto do globo é meio-dia, em qualquer outro ponto a leste desta referência ainda estará em período matutino, enquanto qualquer outro ponto a oeste estará em período vespertino. Embora todos vejam o mesmo Sol no mesmo momento, eles vêem-no de diferentes direções que refletem seus distintos pontos de vista.

Os meridianos são linhas imaginárias que percorrem a superfície da terra desde o pólo Norte até o pólo Sul. A qualquer momento do tempo em que o Sol estiver acima de um meridiano, quem estiver situado neste trecho perceberá que é meio-dia; se vamos orientar nosso tempo pelo Sol, devemos ter em mente que todos os lugares que estão num mesmo meridiano - de Norte a Sul - terão a mesma hora. Lugares que compartilham um mesmo meridiano compartilham uma mesma longitude, que é medida por uma distância angular a Leste ou Oeste do meridiano padrão

(longitude 0°), que passa pela cidade de Greenwich, na Inglaterra. Por Recife passa um meridiano que parte do pólo Norte, cruza a linha do Equador e alcança o pólo Sul; o arco do equador entre esse meridiano e o de Greenwich mede 34°58’, e, dado que Recife está a Oeste de Greenwich, dizemos que a longitude da cidade de Recife é 34°58’W (ou O).

Um relógio solar construído em função de uma longitude específica exibirá a hora local aparente daquele exato meridiano, compartilhada apenas pelos lugares co-meridionais. Este é o tipo de hora exibido na maior parte dos relógio solares, e, até pouco mais de um século atrás, tem sido empregado como o tipo de tempo padrão na vida cotidiana.

Há de se observar, entretanto, que o tempo absoluto marcado pelo Sol apresenta variações de velocidade ao longo do ano, como explanado anteriormente: há um aumento da velocidade do planeta quando este está mais próximo do Sol (em torno do periélio) e um abrandamento quando está mais afastado (em torno do afélio). Deste modo, fez-se necessária a elaboração de uma equação do tempo, que permite emular um ‘Sol relativo’ de velocidade constante.

Ainda assim, estabelecida uma hora local média, a hora mostrada em um relógio solar

representa uma hora meridional específica. Como na prática essas diferenças repercutiam em alguns problemas em relações comerciais, de telecomunicação e afins - a reparar que uma distância de 160 quilômetros entre dois meridianos representa uma diferença de cerca de 7 minutos, estabeleceu-se no Brasil, em 1914, a política dos fusos horários.

Brasília está 47º25’ a Oeste de Greenwich, o que lhe confere - por aproximação a 45º - o fuso horário global de GMT-3 (3 horas a menos que Greenwich). Já dentro do terrítório brasileiro, há uma política de fusos horários específica, aproximada à global, que margeia os limites políticos de alguns estados. Pernambuco encontra-se na faixa dos estados que compartilham a hora de Brasília. Portanto, se quisermos equalizar a hora exibida num relógio solar em Recife e a hora de um relógio digital, este ajustado com o horário de Brasília, precisamos de um outro fator de correção, o fator de correção de longitude.

Esta diferença, que neste exemplo pode chegar a quase uma hora no início de novembro, justificou não somente a abolição dos relógios solares dos costumes cotidianos da conteporaneidade, mas a nossa transferência para um mundo de temporalidade sintética, cada vez menos sensível aos detalhes de nossa condição terrena em meio a uma natureza que transcende o globo e nos liga ao cosmos.

A concepção do relógio Analemmatos fundou-se na avaliação de várias formas e escalas, de tal maneira que o vislumbre da paisagem sofresse a mínima maculação. Tais formas fundamentaram-se sempre nos estudos de projeções de sombras e curso solar daquelas exatas latitude e longitude, que requereram extensivos cálculos e experimentações a céu aberto, de modo que o erro fosse reduzido à mínima porção possível.

Em respeito à proximidade com o Equador, ou seja, ao trânsito do Sol pelos dois hemisférios relativos, partiu-se inicialmente de um modelo bifacetado, orientado para o Sul e com faces com leves declinações para Leste e Oeste.

Um segundo modelo, interessado em decompor o primeiro em fragmentos mais alastrados em relação ao solo, apresenta mais faces de projeção umbrática. Espalha o monólito original em uma escultura essencialmente horizontal, mas ainda densa diante do entorno e em sua condição de mediador da paisagem.

Não obstante, em uma terceira investida, compôs-se um terceiro modelo, conceituado sob influência do modelo inca Intihuatana. Este, composto de uma única face plana com inclinação de 30° em relação ao solo, remete ao altar cerimonial de adorações e sacrifícios, cujo fundo contempla os verdes montes de Machu Picchu.

Segundo a praxe, o ângulo de reclinação seria aquele idêntico ao da latitude do lugar, ou seja, 8° 3' 14". Mas aí teríamos um plano quase horizontal, o que era definidamente indesejável. Coube, então, encontrar o maior ângulo possível para que a própria superfície não viesse eventualmente a ocultar-se em penumbra ao longo do ano. Para preservar algum contraste de sombras até as 17h seria eficiente um ângulo máximo aproximado a 35°. O ângulo de 30° foi escolhido por ser instrumentalmente mais prático de ser trabalhado.

Aqui, a nova forma permite um debruçar sobre o monólito que se deita, onde a sombra percorre o seu dorso de tal modo que o curvo limite inferior dessa superfície é exatamente a linha de tangência máxima da sombra do gnômon, e que representa com precisão o solstício de inverno, entre os dias 20 e 21 de junho. Na verdade, todas as linhas que compõem o desenho superior do relógio justificam-se em função dos pontos cardeais e das efemérides solares.